Audiência Pública rejeita por unanimidade proposta da Secretaria de Cultura de Guarulhos e inicia nova construção coletiva do PAR da PNAB 2º Ciclo
A Audiência Pública promovida pelo Conselho Municipal de Políticas Culturais (CMPC), realizada no último dia 5 na Biblioteca Monteiro Lobato, rejeitou por unanimidade a proposta do Plano de Aplicação de Recursos (PAR) para o segundo ciclo da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), encaminhada pelo Secretário de Cultura de Guarulhos. O documento foi amplamente criticado pelos participantes, que agora se preparam para formular uma nova proposta.
Contexto do encontro
A audiência teve início às 15h40, presidida por Rosi Marx, presidente do CMPC, que iniciou o encontro destacando a importância do debate democrático, ressaltando a baixa adesão presencial em contraponto ao intenso engajamento nas redes sociais. “Precisamos pôr a mão na consciência e perceber que só venceremos uma luta se formos para a guerra”, afirmou, enfatizando a necessidade da participação efetiva da sociedade civil.
O PAR enviado pela Secretaria destinava um orçamento aproximado de R$ 7,8 milhões, priorizando ações de formação cultural, circulação cultural e obras de infraestrutura, sendo esta última a mais controversa, principalmente pela alocação de R$ 3 milhões para elaboração de projetos executivos de reforma, sem garantia imediata de execução.
A audiência pública foi transmitida ao vivo pelo canal do youtube do Conselho Municipal de Políticas Culturais e segue disponivel. Clique aqui para assistir!
Falas iniciais
A presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais (CMPC), Rosi Marx, abriu oficialmente a audiência pública para discutir o segundo ciclo do Plano de Aplicação de Recursos (PAR) da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB). Realizada por iniciativa do Conselho, a audiência tem como objetivo debater o documento enviado pela Secretaria de Cultura no último dia 27. Em sua fala inicial, Rosi destacou a importância da participação popular direta na construção de políticas culturais, registrando preocupação com o baixo engajamento presencial em contraste com a grande repercussão nas redes sociais.

Rosi Marx reforçou a necessidade de que as críticas feitas ao PAR sejam acompanhadas de propostas concretas para substituição dos pontos considerados negativos. A presidente afirmou que o Conselho abrirá, entre os dias 10 e 21 de julho, uma nova consulta popular por meio de um formulário online, cujas sugestões serão sistematizadas e avaliadas em reunião extraordinária do CMPC, marcada para 29 de julho. Os resultados desse processo serão encaminhados à Secretaria de Cultura até o dia 2 de agosto.
Durante a audiência, Rosi também destacou recentes alterações nas diretrizes da PNAB estabelecidas pelo Ministério da Cultura, entre elas a garantia de percentuais mínimos destinados ao fomento de ações continuadas, requalificação de espaços culturais e formação de gestores. Essas mudanças reforçam o compromisso com a continuidade e sustentabilidade das iniciativas culturais independentes nos territórios, ampliando significativamente o alcance e impacto social das políticas culturais no município.
Clique aqui para acessar o conteúdo integral do ofício 050/2025 – SC encaminhado pelo Secretário de Cultura ao CMPC.
Críticas e contribuições
A atriz e produtora cultural Pamela Regina abriu o debate apontando graves incoerências no documento, como o valor anunciado de R$ 23 milhões investidos nos últimos anos, que representaria apenas R$ 8 por habitante ao ano—um montante insuficiente para promover acesso efetivo à cultura. Pamela solicitou a imediata rejeição do documento, criticando especialmente a falta de clareza sobre os gastos previstos para a elaboração de projetos, estimados em R$ 3 milhões, sem garantia de execução posterior.
As críticas foram ampliadas pelo diretor da Companhia Arlequins, Sérgio Santiago, que ressaltou a urgente necessidade de criação de uma verdadeira “cena cultural” em Guarulhos. Baseando-se em seus mais de 50 anos de experiência artística, Santiago destacou a importância de conectar efetivamente as produções culturais ao público das periferias, sugerindo ações práticas como o fornecimento de transporte gratuito e a promoção contínua de mostras culturais para fortalecer vínculos com a população.
Complementando as críticas, o produtor Roman Lopes apontou inconsistências internas no PAR, especialmente em relação aos gastos excessivos destinados apenas à elaboração de projetos. Roman destacou que muitas das ações citadas no documento não têm recursos garantidos e sugeriu que a Secretaria realize uma nova audiência pública para construir uma proposta mais coerente e realista junto aos artistas locais.
O artista Rafael Ferro também questionou o valor divulgado de R$ 23 milhões, destacando que houve um constante desrespeito ao orçamento previsto no Plano Municipal de Cultura. Ferro exigiu maior transparência e cumprimento efetivo da meta de destinação mínima de 1% do orçamento municipal para a cultura, destacando que essa meta está longe de ser alcançada.
Produtor e gestor cultural, Vitor Souza criticou a ausência de uma visão estratégica da gestão municipal atual, que, segundo ele, ignora o Plano Municipal de Cultura, comprometendo a continuidade dos projetos já existentes. Vitor propôs que artistas enviem propostas concretas por meio da consulta pública online para subsidiar a construção de um novo PAR que dialogue com as necessidades reais do setor.
Franklin Jones, presidente da ACING, classificou o documento como “afrontoso”, exigindo formalmente sua rejeição. Jones destacou que os gastos previstos para a elaboração de projetos são irresponsáveis e reforçou a necessidade de uma nova discussão democrática para definir a política cultural da cidade.

Wescley Tinoco, presidente da Liga Guarulhos de Capoeira, destacou o descaso histórico com a modalidade na cidade, reivindicando mais apoio em eventos culturais e a inclusão da Praça do Capoeirista nas reformas de equipamentos públicos. Ele ressaltou que, apesar do reconhecimento internacional, os mestres locais ainda são negligenciados em Guarulhos.
Representando o hip-hop e o Havana Futebol Clube, Léo do Baquira enfatizou a importância dos editais de produção cultural, alertando sobre o risco de enfraquecimento da cultura local caso o fomento seja interrompido. Defendeu que, caso necessário, o Conselho Municipal deve recorrer ao Ministério Público para garantir a correta aplicação dos recursos culturais.
Ermano Rock Bravo, músico local, criticou a ausência de investimentos para o gênero rock, destacando que, apesar do interesse demonstrado pela população, eventos expressivos voltados ao estilo são inexistentes. Ele reforçou que festivais culturais beneficiam toda a economia local, proporcionando lazer e qualidade de vida à população.
Alexandre Leão, representante da ACING, levantou preocupações sobre a relação entre o PAR e o orçamento municipal, afirmando que há um aparente desinvestimento da Prefeitura na cultura. Para ele, é preocupante que investimentos essenciais sejam condicionados exclusivamente à PNAB, negligenciando a obrigação municipal de garantir políticas culturais permanentes.
O músico Aldo di Julho lamentou a ausência de diálogo da gestão com os artistas locais, pedindo maior mobilização da classe artística para defender seus interesses e garantir gestores qualificados e comprometidos com a cultura da cidade.
Rafaela Hilário, da associação Pretos em Conexão, criticou fortemente a lógica neoliberal do PAR, destacando o enfraquecimento das associações culturais e movimentos sociais nas periferias. Rafaela alertou que o documento privilegia contratações privadas, prejudicando o trabalho histórico desenvolvido pelas associações culturais.
João Perreka, artista com longa atuação na cidade, destacou que os editais emergenciais, como a Lei Aldir Blanc, são fundamentais para garantir emprego e sobrevivência aos artistas locais. Alertou que, sem o fomento contínuo, a cidade corre o risco de perder sua força cultural, obrigando artistas a buscarem oportunidades em outras cidades.
Finalmente, Nelson Simplício, cineasta e representante do Cine Clube Kinoférico, denunciou a visão equivocada apresentada no documento sobre circulação e formação cultural. Ele exemplificou o sucesso obtido por projetos culturais recentes, destacando o filme local “O Moti”, que foi qualificado para concorrer ao Oscar. Nelson alertou que a interrupção dos editais poderia causar uma grave ruptura no desenvolvimento cultural, prejudicando conquistas já realizadas.
Votação e encaminhamentos
Encerrada a etapa de escuta das manifestações individuais, a presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais, Rosi Marx, retomou a condução dos trabalhos destacando um ponto relevante do Plano de Aplicação: a ausência da continuidade do projeto de restauro da Casa da Candinha no ciclo 2, apesar da previsão de execução em três fases previamente aprovadas pelo Conselho.
Rosi alertou para os riscos dessa descontinuidade, especialmente diante das incertezas políticas futuras, como uma possível mudança no Governo Federal em 2026, que poderia comprometer as políticas de fomento à cultura como a PNAB e a Lei Paulo Gustavo. Com esse argumento, defendeu a importância da manutenção de ações estruturantes, principalmente na área do patrimônio cultural.
Roman Lopes complementou dizendo que a falta de continuidade e a morosidade da gestão na execução de projetos, como é o caso da Casa da Candinha, pode prejudicar a habilitação do município nos próximos ciclos. Franklin Jones reforçou esse risco, argumentando que a execução de recursos por parte da sociedade civil ocorre com mais agilidade e eficácia do que a execução direta pelo poder público. Para ele, a ausência de editais de fomento compromete a celeridade e, consequentemente, a capacidade do município de se manter elegível aos ciclos seguintes da PNAB.
Outro ponto destacado foi a recente mudança na estrutura administrativa da Secretaria de Cultura, que passou a incorporar o Departamento de Turismo. Roman, Rosi, Rafaela Hilário e Vitor Souza abordaram essa alteração com preocupação, pontuando a necessidade de acompanhar de perto o impacto dessa fusão e garantindo que os recursos da cultura não sejam redirecionados indevidamente para outras finalidades. Rafaela propôs a inclusão do tema como ponto de pauta para as próximas reuniões do Conselho.
Ao final dos debates, foi realizada a votação da proposta encaminhada pela Secretaria de Cultura para o Plano de Aplicação do ciclo 2 da PNAB.
A proposta foi rejeitada por unanimidade pelos presentes. Ficou deliberado que o Conselho seguirá com a segunda etapa de participação popular, por meio de formulário eletrônico que será aberto no dia 10 de julho, possibilitando o envio de propostas pela sociedade civil. Em seguida, essas propostas serão organizadas, debatidas e votadas em fórum público a ser realizado no dia 26 de julho, às 10h, no Adamastor, caso haja disponibilidade do espaço.

Pamela Regina reforçou que esse será o momento de sistematizar as contribuições populares e definir, com quórum deliberativo dos conselheiros, a versão final do Plano de Aplicação a ser encaminhada ao Ministério da Cultura. Recomendou que artistas e agentes culturais procurem seus conselheiros de linguagem para garantir a representatividade no processo.
Roman Lopes propôs que o Conselho convide oficialmente o Secretário de Cultura e o Subsecretário para comparecerem ao fórum de 26 de julho, a fim de dialogar publicamente com a sociedade civil sobre o plano, o que foi acatado pela presidência do Conselho.
Com agradecimentos finais e apelo à mobilização contínua dos trabalhadores da cultura, a audiência pública foi encerrada com o compromisso de manter a articulação e o acompanhamento permanente das próximas etapas da PNAB e das políticas culturais do município.

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