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101 dias de gestão da cultura da cidade

Por Vitor Souza

Quando se trata de política cultural, o tempo nunca é neutro. Os primeiros 100 dias de um governo dizem muito sobre o que está por vir — e, talvez, mais ainda sobre o que ficou para trás. Em Guarulhos, esses 100 dias da nova gestão municipal passaram em branco na apresentação oficial feita pelo prefeito Lucas Sanches à população. Entre obras, programas e anúncios diversos, nenhuma menção à cultura. No entanto, no dia seguinte, no dia 101, uma matéria no site oficial da Prefeitura buscou preencher essa ausência com um balanço específico da Secretaria de Cultura. Uma sinalização tardia, mas necessária.

Sob a liderança do secretário João Márcio Vaz, a pasta apresentou uma série de iniciativas e retomadas importantes, com destaque para o programa Secretaria de Cultura de Portas Abertas, que promete mais agilidade e humanidade no atendimento aos agentes culturais. A digitalização de processos via WhatsApp e a reorganização das equipes técnicas parecem indicar um esforço de gestão interna — algo fundamental para dar conta das demandas que se acumulam na cidade.

O Conservatório Municipal e a Escola Viva de Artes Cênicas também mostram sinais de fôlego. O primeiro segue como referência formativa em música, com novos alunos e continuidade dos cursos. Já a Escola Viva, agora com aulas noturnas e maior número de vagas, passou de 30 para 110 alunos, um salto de 275%. São avanços que mostram capacidade de resposta diante das necessidades reais da cidade.

As ações nas bibliotecas também merecem destaque, em especial a reabertura da Orobó Mikail, fechada há meses. A criação de um espaço de troca de livros ali, por exemplo, é mais que uma ação simbólica: é um passo concreto em direção ao incentivo à leitura e à cidadania cultural nos bairros.

No campo do fomento, a chegada de novos Pontos de Cultura e o repasse de R$ 1,4 milhão para iniciativas de produtores periféricos apontam para um direcionamento promissor — tanto no aspecto da democratização do acesso quanto na distribuição territorial dos investimentos. A execução dos recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) e o lançamento de editais locais também reforçam a importância da continuidade de políticas públicas de cultura estruturadas.

Mas é importante dizer: a ausência da cultura nos primeiros 100 dias da fala oficial do prefeito não é só um detalhe. É um sintoma. Um alerta. A cultura — ainda que presente nos bastidores, nos editais e nas ações concretas — precisa ocupar o centro do debate público. Não por vaidade, mas por necessidade. Em uma cidade como Guarulhos, onde a diversidade pulsa nos bairros e a criação cultural transborda em coletivos, palcos, telas e livretos, a política cultural não pode ser coadjuvante.

Estamos no dia 103. Ainda há tempo para ajustar as lentes. Que a gestão compreenda que cultura não é ornamento — é estrutura. E que cada ação, cada biblioteca reaberta, cada vaga ampliada, cada projeto fomentado seja também uma construção de cidadania. Porque, no fim, é disso que se trata: de garantir que a cidade toda tenha o direito de criar, sonhar e contar sua própria história.

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