Cinema e inclusão: alunos do Conservatório de Guarulhos participam de exibição do documentário Além do Concreto
Filme do cineasta guarulhense Rodrigo Medrado fala sobre os mestres da cultura popular na cidade.
A banda Música do Silêncio – programa de inclusão musical do Conservatório Municipal de Guarulhos para pessoas com deficiência coordenado pelo maestro Fábio Bonvenuto, recebeu no último dia 6 uma sessão inclusiva de cinema com a exibição do curta-metragem Além do Concreto, do cineasta guarulhense Rodrigo Medrado, filme que fala sobre os mestres da cultura popular na cidade. A exibição contou com recursos de acessibilidade, Audiodescrição, tradução em Libras e Legenda Descritiva.
Além do Concreto destaca as histórias de cinco mestres da cultura popular, pessoas oriundas de diferentes regiões do país e que encontraram em Guarulhos um lugar para perpetuar seu legado cultural, criar e sustentar a família: o poeta cordelista Bosco Maciel, o violeiro Antony Ventura, a artesã indígena Maria Pankararé, o luthier Di Oriente e o Pai Luiz do Terreiro Quiguiriça.
Desses depoimentos, o documentarista extraiu inquietudes, relações com seu trabalho e o modo como resistiram, uma forma de dar vazão às suas próprias inquietações com o modo de vida nos centros urbanos.
Música do Silêncio
A banda é um espaço não só de aprendizado musical como de reflexão a respeito das potencialidades e sobre o quanto as iniciativas inclusivas podem modificar a vida das pessoas com deficiência entre a sociedade e também consigo, em harmonia com seus sentidos e realizando-se artisticamente. Participam do projeto pessoas com deficiência visual, com transtorno do espectro autista e também com deficiência auditiva.
O professor Fábio Bonvenuto explica que a cada ano a turma se renova, porém, alguns participantes permanecem. Ele recordou que a aluna mais antiga da turma, Bruna Carolina Neiva Ramos, que é tecladista, está com a Música do Silêncio há 17 anos; ela é deficiente visual e autista. Bonvenuto também falou um pouco sobre a maneira como a música atinge mais de um sentido e atua como um elemento de linguagem e sensibilidade em relação à peculiaridade de cada integrante.
“A música, mais do que só arte, é essência de vida. O deficiente visual acaba direcionando uma boa parte de sua memória, que seria visual, para a memória auditiva. O autista, que tem a característica do hiperfoco, acaba por conciliá-la com a prática do instrumento e com a apresentação musical, e até mesmo o deficiente auditivo, que sente a música por meio da vibração em seu corpo, consegue transformar isso em arte”.
O maestro Marcelo Mendonça, diretor do Conservatório, demonstrou seu apoio ao projeto de sucesso. “Mais do que para o Conservatório ou até mesmo para a cidade, esse é um trabalho para tocar a vida de todas as pessoas que participam. Tanto os alunos quanto os profissionais se sentem igualmente transformados a cada encontro”.
Célia Soares, mãe de João Victor Soares, que tem 12 anos e é autista, está chegando agora ao Conservatório por recomendação médica após o diagnóstico de seu filho e está esperançosa. “A música abre horizontes emocionais e no caso do João Victor eu confio que vai ajudá-lo a expressar seus sentimentos e emoções e vai abrir os horizontes da alma dele, permitindo que vença suas dificuldades de relacionamento”.
Abrão André Bispo, deficiente visual, saxofonista e violeiro, é músico autodidata desde a infância e tem se aprofundado no conhecimento teórico e na escrita musical, aprendendo musicografia em Braille. “O poder público costuma colocar o deficiente em um cantinho – não o conhece e não quer conhecer. Aqui no Conservatório existe a importância do conhecimento musical, mas acima disso nosso grupo cultiva dois outros valores: a civilidade e a inclusão. Nós cegos vivemos sim no escuro, mas não somos o escuro; nós temos imagens em nossa mente, e isso nos faz viver”.
Já a trompetista Naomi Scamardi, de 21 anos, paz parte da turma há três anos. Ela ressaltou dois aspectos que julga importantes – sua empatia entre os colegas de diferentes características e a mudança que a banda promoveu em sua relação com as pessoas. “Na banda eu tenho a possibilidade de entender a vivência de pessoas com outras deficiências diferentes da minha. Quando eu cheguei não falava e não olhava no rosto das pessoas, mas hoje estou aqui relatando minhas sensações. A música sempre esteve na minha vida, é arte, é paixão, e está em cada pequena coisa, até mesmo no silêncio”.
Foto: Márcio Lino/PMG