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Longa-metragem da Companhia Bueiro Aberta aborda trajetória de luta e ativismo do Havana Futebol Clube

O cineasta guarulhense Renato Queiroz conversou com a Guarulhos Cultural e contou como o filme foi idealizado e o modo como um grupo de amigos buscou uma identidade na qual fosse possível abertura para a criticidade dentro da cultura do futebol

Em comemoração ao aniversário de 15 anos da Velha Guarda Maromomi e os três anos do Havana Futebol Clube, a Companhia Bueiro Aberto lança o longa-metragem Havana: Resenha Futebol e Luta no próximo sábado, 16 de julho, às 20h, na Apeoesp Guarulhos. O espaço abre às 18h e conta com discotecagem do DJ Billy Di Boa. A Apeoesp Guarulhos fica na Rua Leonardo Vallardi, 203, no Jardim Gumercindo, centro de Guarulhos.

O filme aborda a trajetória de luta e ativismo do time em meio a histórias de amor, solidariedade e amizade entre ex-participantes da torcida organizada do AD Guarulhos. Com 74 minutos cuidadosamente extraídos de um conteúdo de mais de 30 horas de gravações, o documentário tem roteiro e direção de Renato Queiroz, direção de fotografia e atuação de Daniel Neves e direção de fotografia de Diego Andrade. Havana: Resenha Futebol e Luta completa com Na Marca do Pênalti (2017) e Um Dia de Várzea (2020) a trilogia do cineasta guarulhense sobre futebol, resultado de sua paixão.

Renato Queiroz conversou com a Guarulhos Cultural e contou como o filme foi idealizado. Para além de suas motivações pessoais, falou ainda do modo como um grupo de amigos buscou uma identidade na qual fosse possível ter abertura para a criticidade dentro da cultura do futebol para combater valores regressivos e apontar valores progressistas de inclusão e superação das formas de opressão.

Encantamento do futebol de várzea

O sentimento de amizade que cresceu no ativismo no Comitê de Luta pelo Transporte Público, nos movimentos estudantis e sindicais de professores também se refletia nos dias de jogo do AD Guarulhos, nos churrascos, nos momentos de falar mal do capitalismo e tomar cerveja juntos. Para falar da gênese do Havana, Renato revisitou suas memórias, as de Lionel Fontanesi, presidente do Havana, e de Fábio Careca, produtor do filme Na Marca do Pênalti.

“Torcedor do Vila das Palmeiras, time de várzea da cidade fundado em 1964, e que depois se tornou o AD Guarulhos, o avô do Lionel, Sêo Benedito, tinha um bar próximo ao Padre Bento. Já o pai do Careca, o Sêo Magrão, era volante do Vila das Palmeiras. Quando o Lionel e o Fábio se conheceram nos movimentos sociais, eles descobriram que seus pais também se conheciam, uma coincidência não tão grande e que motivou a organização da torcida”.

Foi nesse contexto que, em 7 de julho de 2007, surge a torcida organizada do AD Guarulhos, e eles seguiram com ela por mais de 10 anos, quando, em 2019, houve um desacordo com a presidência do time.

Para estruturar a nova torcida, os dissidentes do AD Guarulhos mergulharam no encantamento do futebol de várzea e seu conceito. “Na época do espaço Florestan Fernandes, Lionel, Raphael Balco, Nadia Aline, Sid Cerveja e Tiago já tinham em comum a simpatia pelo futebol para além do torcer. Eles tinham o desejo de entender o futebol como fenômeno da sociedade, como fenômeno cultural, e o olhar antropológico de Lionel sempre pairava na tentativa de entender o futebol como uma expressão muito espontânea de cada bairro da cidade”.

Paz entre as torcidas e guerra entre as classes

Em 2020, durante a pandemia, os participantes do Havana Futebol Clube estruturaram e fortaleceram os debates e, em 2021, com o avanço da vacinação, começaram os jogos e as atividades dos times.

“Em 2022, todos os processos sociais com os quais o Havana FC está envolvido despontaram para além das atividades esportivas, as culturais, as sociais e o próprio time de várzea, que disputam com outros times de várzea que também tem posicionamento anti-fascista, como o Libertários, um time de São Bernardo do Campo, formado por anarquistas, e O Centenário, que tem relação com o futebol uruguaio, na garra e vontade de ganhar”.

Além do time de várzea e do futsal feminino, o Havana FC dedica-se à coordenação da escolinha popular de futebol do projeto Ocupafut, no centro esportivo João do Pulo, em Guarulhos, e às aulas de boxe e basquete na Escola Estadual Vereador Antônio de Ré, no bairro do Macedo.

Para chegar à gênese do movimento e desnudar a rotina, funcionamento do organismo e processos internos do time, Renato fez entrevistas estruturadas com Raphael Balco e Lionel Fontanesi.  Já a parte que conta a vida prática do time é ancorada, sobremaneira, na observação.

“Um aspecto muito forte nesse filme é a não intervenção nas cenas. Não foram excluídas entrevistas e eu me valho bastante da observação. Uma das cenas que eu gosto bastante é a do registro de uma reunião do time. Não entrevisto ninguém, apenas observo enquanto eles discutem como intervir junto ao MTST, na Ocupação Maria da Penha, e cada um dá seu ponto de vista, tiram conclusões e sugerem atividades que podem ser realizadas naquele espaço”. Para Renato, outra passagem marcante são as cenas feitas durante os treinos do time feminino, uma sequência extensa dedicada a esse projeto.

Não existe imparcialidade no cinema

Para o cineasta Renato Queiroz, foi muito natural fazer os filmes da trilogia, considerando que a produção cinematográfica da Companhia Bueiro, seu ambiente e vivências de seus participantes está completamente imbricada em questões políticas, sociais e de mobilização cultural.

Sua expectativa em relação ao olhar do espectador para o longa-metragem é de que cada um possa contribuir com críticas e reflexões a partir das escolhas que foram feitas e planejadas em cada cena. “Nós, os cineastas, somos muito críticos em relação ao trampo que a gente faz, temos a visão de que algo está faltando e eu sempre me surpreendo com o que o público consegue captar, quando alguém aponta um aspecto que eu mesmo não havia percebido na hora em que estava elaborando o filme. As pessoas têm outras percepções e acabam trazendo outros elementos sobre o filme. Claro, eu gostaria muito que todas elas pudessem curtir o filme, sempre fazemos dinâmicas em que são inseridos elementos da Cultura para que  exibição do filme seja uma experiência agradável. Mais que isso, eu espero que o filme traga algumas reflexões, sobre o que é o futebol com cultura, sobre essa contradição entre um futebol milionário e um futebol de luta, as reflexões que os personagens trazem para o filme, de que o futebol de várzea é uma atividade cotidiana, na qual é possível estabelecer um olhar antropológico para compreender seus mecanismos de funcionamento”.

Renato cita a cineasta e diretora brasileira Maria Augusta Ramos, segundo a qual não existe imparcialidade no cinema. Para o jovem cineasta, importa olhar para o público que assiste ao filme e perceber suas reações.

“Tudo depende do ponto de vista subjetivo do documentarista a partir de escolhas e cortes para a apresentação de diversas possibilidades. O telespectador é um percebedor; como cineasta, editor do filme, sou eu quem ofereço o que será percebido, as imagens, os corpos em movimento e os sons que esse telespectador vai perceber e vai, de alguma forma, “liquidificar” em sua cabeça. Eu quero muito saber o que o público vai falar, saber de suas reações, espero que esse processo seja agradável, o que vai ser extraído desse material e que o filme seja exibido para o maior número de pessoas, professores, estudantes, público em geral, o mais variado leque de olhares possível”.

Depois do evento de lançamento do filme durante a festa de aniversário do Havana Futebol Clube, Renato Queiroz conta com a possibilidade de inscrever o longa na Mostra Guarulhense de Cinema, realizar exibição nas sessões do Cineclube Incinerante e no CINEfoot, Festival de Cinema de Futebol.

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